Gato preto não dá azar

“Espírito, entra em casa.” Assustou? Calma. A frase é dita com frequência por Ana Gabriella Papst, 9 anos, de Santo André, para chamar o gatinho da tia. Em geral, a vizinhança se espanta ao ouvir o nome do felino e arregala mais os olhos ao ver que tem pelagem negra.

Não é de hoje que os gatos pretos são vistos com desconfiança. Ainda há quem acredite que dão azar. Ana Gabriella discorda completamente: “O Espírito é carinhoso e sempre deu sorte para minha tia”. Na opinião da menina, bichos dessa cor são os mais bonitos.

Mas por que são sinônimos de má sorte? Tudo começou na Idade Média (entre os séculos 5 e 15). Naquela época, as cidades eram cheias de ratos; comida era o que não faltava aos felinos. Então, a quantidade deles aumentou demais. Por terem hábitos noturnos e olhos que brilham no escuro, a população começou a inventar histórias e compará-los a seres do mal, principalmente os de pelos escuros.

Acreditava-se que eram bruxas em forma de animal (como os animagos de Harry Potter). Por isso, eram maltratados e, em alguns casos, queimados vivos junto a pessoas acusadas de bruxaria. No século 15, o papa Inocêncio VIII autorizou a perseguição aos bichanos. A violência começou a diminuir apenas a partir de 1630, quando o rei da França Luís XIII a proibiu.

Parece coisa do passado, mas o homem ainda maltrata o animal. Aliás, gatos pretos são frequentemente mortos em datas comemorativas como Semana Santa, Halloween e Sexta-feira 13. Desse modo, quem tem bichinho desta cor deve ficar atento e não deixá-lo andar sozinho por aí nestas datas.

Para protegê-los, o Centro de Controle de Zoonoses de São Paulo proibiu, em 2009, a adoção nesses dias. Agora, a iniciativa é tomada todos os anos por ONGs (Organizações Não Governamentais) e associações de proteção animal. Até em dias comuns, os protetores tomam cuidado ao doá-los. Em geral, fazem acompanhamento para ter certeza de que o felino está sendo bem cuidado.

Por causa da superstição, também são os menos adotados. Entretanto, há famílias, como a de Ana Gabriella, que não se importam com a cor dos pelos do bichano. Como sabem que as histórias não são verdadeiras, querem ajudar a acabar com o preconceito. Agora, o próximo plano da tia da menina é adotar um felino branco. O nome já foi escolhido: Alma, para combinar com Espírito!

Curiosidades
– Gatos pretos fazem sucesso na telinha. Um dos mais conhecidos é o Gato Félix. O personagem animado, de pelos negros e risada diferente, sempre se mete em confusões. Para solucionar problemas, usa o próprio rabo como ferramenta. Há também os bichanos falantes de filmes, como Salém, de Sabrina: Aprendiz de Feiticeira, e Binx, de Abracadabra.

– Os gatos da raça bombay têm pelos pretos, tamanho médio e olhos cor de cobre ou dourados. A raça foi criada pela norte-americana Nikki Horne, em 1965.

– Outra superstição diz que o gato – de qualquer cor – prevê o tempo. Quando arranha tapetes e cortinas significa que vai ventar. Se limpa muito as orelhas ou olha pela janela vai chover. Caso sente de costas para o fogo fará frio. Se dormir com as quatro patas debaixo do corpo é que o mau tempo chegará. Marinheiros até levavam felinos em viagens, pois se miassem alto era sinal de que enfrentariam dificuldades.

– Registros antigos mostram que o medo exagerado de gatos – chamado fobia – existe desde a época em que eram cultuados pelos egípcios. Na Idade Média, quando passaram a ser ligados ao mal, tornou-se mais comum. O pavor de bichanos recebe o nome de ailurofobia ou gatofobia.

Autor: Caroline Ropero
Consultoria: Maria Cecília Bentini, diretora geral da ONG Ajudanimal, de Ribeirão Pires
Fonte: Diário do Grande ABC