Grupos pressionam e mais empresas de cosméticos abdicam de testes em animais

A atriz Kristin Bauer, de “True Blood”, cumpre todos os anos um ritual incomum quando visita sua família em Racine, no Wisconsin: ela pega uma caneta preta e rabisca na lateral de muitos produtos e cosméticos: “Testado em animais”.

“Isso é muito simples para mim: não deveríamos torturar outros seres vivos por um rímel”, afirmou Bauer, vegetariana que mora em Los Angeles com o marido, Abri van Straten, dois cachorros e dois gatos. “Parece tão estranho quando você pensa em creme de barbear e um coelho, ou rímel e um porquinho-da-índia. Não estamos salvando uma vida.”

Como porta-voz da Physicians Committee for Responsible Medicine (comitê de médicos por uma medicina responsável), organização sem fins lucrativos cujas metas incluem promover testes sem animais, Bauer tem uma missão: fazer mais pessoas usarem maquiagens e artigos de higiene pessoal que não foram testados em coelhos, porquinhos-da-índia, camundongos ou ratos. E embora os testes “sem crueldade” sejam há décadas o mantra fundamental de certas linhas como Aveda, Body Shop e Kiss My Face, agora a ideia vem sendo cada vez mais adotada por novos e glamorosos proponentes.

As modelos Josie Maran (josiemarancosmetics.com) e Christie Brinkley (christiebrinkleyskincare.com), e a estilista Stella McCartney (Care by Stella McCartney), estão entre aqueles que criaram linhas de cosméticos desenvolvidas sem testes animais.

Empresas como Clinique, Tarte, Almay e as brasileiras Natura e Nasha (fabricante da Phytoervas) abandonaram a prática. Outras marcas menos conhecidas, como Pixi, Organic Male OM4 (linha de produtos para a pele masculina) e Dr.’s Remedy, um esmalte totalmente natural, nem mesmo começaram.

“Para nós, era importante saber que não haveria animais sendo prejudicados no desenvolvimento ou testes de nossos produtos”, declarou o cofundador da Dr.’s Remedy, Adam Cirlincione, um podólogo de Nova York.

Os consumidores parecem concordar, segundo Nancy Beck, ex-consultora de ciência e diretrizes do grupo de médicos, que conduziu um relatório sobre o assunto enquanto trabalhava lá.

“Parte disso é a consciência sobre a questão em geral”, explicou Beck, que tem doutorado em microbiologia e imunologia. “A ciência evoluiu, e hoje temos tecnologias que talvez não existissem há 30 ou 40 anos, para realizar avaliações de segurança sem usar animais. Assim, ter os métodos disponíveis, e ter empresas se preocupando em investir tempo e dinheiro para desenvolver novos métodos, também tem muito a ver com isso”.

Porém, embora algumas empresas tenham acabado com os testes em animais, levá-las a isso não foi nada fácil. “É difícil conseguir que elas falem com você”, disse Beck. “Você começa escrevendo uma carta: ‘Gostaríamos de conversar com vocês sobre suas práticas de testes, podemos nos encontrar?’ Geralmente nem se recebe uma resposta.”

Em 11 de março de 2009, a União Europeia proibiu que empresas de cosméticos e produtos pessoais testassem seus produtos em animais para verificar coisas como irritabilidade da pele, sensibilidade à luz e toxicidade aguda. A decisão também vetou a importação de cosméticos contendo ingredientes testados em animais. A partir de 11 de março de 2013, as empresas serão proibidas de conduzir testes adicionais criados para estabelecer toxicidade de longo prazo.

Mas não existem leis como essa nos Estados Unidos. O que mais se aproxima é o Safe Cosmetics Act de 2011, que foi introduzido em 24 de junho (ainda não foi adotado) e incentiva, entre outras coisas, o desenvolvimento de alternativas aos testes com animais.

Isso não é o bastante para Vicki Katrinak, administradora da Coalition for Consumer Information on Cosmetics, consórcio de grupos de proteção aos animais (incluindo a Humane Society of the United States, a Doris Day Animal League e a American Anti-Vivisection Society) em Jenkintown, Pensilvânia. “Tememos que, sem incorporar uma proibição total na redação dessa lei, os testes continuem acontecendo”, afirmou ela.

Além disso, o rótulo de “sem crueldade” adotado por algumas empresas de produtos pessoais e cosméticos não possui um significado universalmente acordado. “A FDA diz em seu site que as empresas podem fazer qualquer declaração sobre suas políticas de testes animais, pois não existe uma definição regulamentada do que é ‘sem crueldade’”, explicou Katrinak.

Empresas podem dizer que seus produtos são “sem crueldade” ou “não testados em animais”, continuou ela, mas suas declarações podem se referir apenas ao produto final, e não a ingredientes específicos (o grosso dos testes com animais ocorre no nível dos ingredientes). Ou elas contratam laboratórios terceirizados para fazer os testes por elas.

Até mesmo as afirmações de “totalmente natural” são confusas.

Michelle Larner, maquiadora de Nova York, pensava estar usando somente produtos não testados em animais, por preferir linhas focadas em clientes com pele sensível. Mas então ela visitou o site da organização People for the Ethical Treatment of Animals (PETA), que lista empresas que usam e que não usam testes animais.

“Vi algumas marcas na categoria ‘natural’, que eu simplesmente supunha serem produzidas sem crueldade”, afirmou Larner. Ela ficou chocada ao descobrir que “tudo que eu uso _ rímel, pasta de dentes, desodorante e produtos femininos _ estava na lista. Até mesmo meus produtos de limpeza estavam na lista”.

A maioria dos itens fabricados sem testes animais é de marcas independentes, não disponibilizados prontamente em cadeias de farmácias, lojas de departamentos ou lojas especializadas, acrescentou ela. Também seria mais fácil “se os produtos trouxessem um aviso dizendo ‘Sim, nós testamos em animais’”, disse Lerner. “Eu não compraria esse produto”.

Algumas organizações vêm tentando mudar isso. A PETA licencia sua logomarca do “coelho sem crueldade”.

O Leaping Bunny, programa conduzido pela Coalition for Consumer Information on Cosmetics, fornece um logotipo de coelho às empresas que a organização certificou como sem crueldade. Ela também oferece aos consumidores uma lista dessas empresas.

Segundo Katrinak, até agora cerca de um terço das 400 empresas certificadas usam o logotipo, incluindo Burt’s Bees, Tom’s of Maine, Body Shop e Urban Decay.

Mesmo assim, nem todos acham viável eliminar inteiramente as pesquisas com animais. “A maioria dos ingredientes em cosméticos foi testada há muito tempo, então poucos testes são conduzidos hoje em dia”, afirmou Frankie Tull, presidente da Foundation for Biomedical Research, que promove pesquisas animais responsáveis e conscientes. Mas “em alguns casos, modelos animais ainda são uma parte necessária para assegurar que os ingredientes não causarão danos a seres humanos”.

Bauer, que indica as marcas Almay e bareFaced Mineral Cosmetics, não aceita esse argumento. Ela consulta frequentemente o site da PETA, para ver quais produtos usam ou não testes com animais.

“Conferir essa lista leva cinco minutos”, disse ela. “Os produtos não testados geralmente são mais orgânicos e naturais. Algumas vezes eles são até mesmo mais baratos”.

Fonte: iG