Mulheres tratam seus pets como verdadeiros filhos

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Todos os dias eles saem para um passeio pelo bairro. Antes de voltarem para casa, uma pausa na cafeteria predileta. Lá, o garçom, que já os conhece, serve uma jarra de suco de melancia, o preferido do casal. Outro passeio que gostam de fazer é ir ao shopping. E quando ela entra em alguma loja, ele costuma ficar na porta, como fazem muitos maridos. Cenas como essas seriam comuns se não fosse por um detalhe: trata-se de um casal de cães da raça schnauzer, Beethoven, de 10 anos, e Shelby, de 8, que já saíram em capas de revistas e participaram de muitos desfiles de moda.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 59% dos domicílios têm algum animal de estimação, o que inclui famílias das classes sociais A a D. O Brasil é o segundo país no mundo em população de pequenos animais e produção de alimentos para essa “clientela”, perdendo só para os Estados Unidos. O mercado de pets gira cerca de R$ 9,6 bilhões no País, segundo a Associação Nacional de Fabricantes de Produtos para Animais de Estimação (Anfalpet).

Criados com regalias pelas irmãs Selma, uma professora aposentada de 57 anos, e Marcia Hage, biomédica, de 50 – as “mães” -, o casal de cães schnauzer tem de tudo: ração e xampus especiais, gargantilha de pelica, roupinha de plush para o inverno com direito a capuz e detalhes em strass, cobertor, frasqueira para carregar seus kits de banho e de higiene bucal, além das visitas corriqueiras ao veterinário. A cama deles fica ao lado da delas. Nas noites frias, não hesitam em pular para cima e, ainda, dormem com a cabeça no travesseiro. Ah, também adoram passear de carro. E há cinto de segurança próprio para a dupla. O perfume? É francês!

Apesar de todos os cuidados, Beethoven teve seus pelos queimados quando foi tomar banho em uma badalada pet shop de um shopping paulistano. Depois disso, nunca mais foi o mesmo. “Ninguém pode se aproximar com a mão aberta que ele avança”, conta Selma. Para amenizar o trauma, ela tentou vários tratamentos. Levou-o a um veterinário homeopata e recorreu até a um veterinário telepata, que teve a visão do ocorrido.

Shelby é adestrada e adora entregar correspondências, mas já rasgou algumas contas. Ela é mais sensível porque sofre de diabetes, que é amenizada com tratamentos como acupuntura, doses de chá de ervas chinesas (que amenizam a ansiedade), além das idas semanais à clínica, onde toma sua dose de insulina. Beethoven não resiste quando Shelby volta do banho. “Mas ela não gosta de namorar, só quer carinho”, diz Selma.

Os porta-copos, chaveiros e outros acessórios da casa levam a cara dos bichos. O recado da secretária eletrônica avisa que elas saíram para passear com os cachorros. “A nossa vida é praticamente voltada para eles. Não temos marido nem filhos, só os de quatro patas”, diz Selma, com o mesmo carinho e tom de voz que uma mãe fala do seu bebezinho.

Vida de artista

A empresária Cecy Campos, de 40 anos, sempre teve cachorros e não se entendia com os felinos por conta dos arranhões. Até que a charmosa Nikole surgiu em sua vida, num momento em que estava saindo do emprego por conta do estresse que a levou a um estado depressivo. Viajou para visitar os pais e, antes mesmo de entrar na casa deles, Nikole, gata que é uma mistura de persa com vira-lata, deixou sua ninhada para grudar em seu pé. “Passei quatro dias com ela no colo. Voltei para São Paulo e não conseguia mais dormir de saudade”, lembra Cecy. Depois de uma semana e 400 quilômetros rodados, estavam juntas novamente. Desde então, no ano 2000, nunca mais se separaram.

Cecy usou sua experiência profissional e montou o projeto de uma ração premium. Depois foi procurada por uma empresa de cosméticos e, assim, passou a fazer consultoria de negócios e produtos específicos para gatos. “Criei um negócio por conta do afeto que tenho.” Voltou para o mundo da tecnologia da informação para desenvolver um software de relacionamento para apaixonados por gatos.

Nikole virou cat model e foi até assistente de palco de um programa apresentado por Luisa Mell, na Rede TV. A “mãe” garante que todo esse charme é pura genética, já que nunca teve de passar por treinamentos. Desde que sua gata virou celebridade, Cecy evita os passeios que costumavam fazer ao shopping, restaurantes e festas, pois os fãs de Nikole cansam sua beleza. Uma vez por mês, a gata toma banho de ofurô com sais e pétalas de rosas, com direito a massagem.

Nikole tem até uma tiara folheada a ouro. Sua cama foi feita sob medida e com material sintético (respeitando o meio ambiente e o reino animal) – tudo cor de rosa. Tem blog, fã clube, já foi capa de dezenas de revistas, atuou num set de filmagem, é mascote de uma empresa que pensa em fazer um boneco seu, “assina” uma linha de cosméticos exclusivos para gatos, tem grife, e tudo o que leva sua assinatura passa por um rigoroso teste de qualidade. Mas também faz boas ações. É que seus aniversários – com direito a bolos para gente e para animais – são comemorados em uma ONG.

Ela, a Nikole, adora viajar. E quando é de avião, vai no colo da mãe, se hospeda no hotel e aproveita para desfrutar o Dia da Gata. Já fez passeios de escuna e de teleférico. Como fica dentro da bolsa e no colo de Cecy, nem se abala. “Ela completa tudo em minha vida.” No começo, a família estranhou. Mas hoje a mãe de Cecy telefona para perguntar da neta de quatro patas. Cecy vive intensamente cada instante ao lado da “filha”, pois sabe que um dia ela vai morrer.

Gata cantora

A atriz e cantora Eduarda Fadini, que está em cartaz no Teatro da Casa da Gávea, no Rio, encontrou sua gata quando saía de uma gravação. “Ela veio na minha direção toda suja de lama, e era tão pequenina que cabia na palma da minha mão”, lembra ela, que, na época, tinha uma sheepdog chamada Leslie em casa, que também adotou a gata. As três viviam juntas até que a cadela morreu e, depois disso, a gatinha perdeu um pouco da alegria.

Mas Sidarta e Yasodhara, dois cães da raça lhasa apso, vieram renovar as energias do lar. “Eles passam o dia brincando. Um correndo atrás do outro, parece desenho animado”, conta Eduarda, que dá aulas de canto em casa, com direito a uma canja da charmosa Yashodhara. “Às vezes ela vai para o estúdio e vocaliza comigo. Mas quando tem alguém ou uma câmera ligada, ela não canta”, diz Eduarda.

Lembra com carinho do primeiro cachorro que teve na vida. Ela tinha 6 anos e foi com os pais a uma exposição de animais. Antes de saírem de casa, teve de lhes prometer que não pediria um cachorro. E não pediu. Mas um filhote de cocker spaniel pulou no seu colo e ali ficou até o fim do evento. Os pais ficaram com dó e o bichinho viveu 10 anos de pura aventura com a família.

Alguns anos depois, a história se repetiu. Só que, dessa vez, com o marido. O casal de músicos passava por uma fase difícil financeiramente. Certa tarde, foram dar uma volta no shopping e se depararam com uma pet shop. O marido a proibiu de pegar qualquer bicho no colo (assim como fizeram seus pais). “Quando entrei, havia uma bola de pelo cinza, que começou a se mexer. Eu quis pegar, mas ele não deixou”, lembra, referindo-se ao cachorro da raça lhasa apso. Em seguida, uma funcionária pediu a Eduarda que segurasse o cachorro enquanto fazia uma higienização no local. “Ele se derreteu na minha mão, me apaixonei na mesma hora. Olhei para meu marido e ele falou que não poderia comprar.”

O cachorro custava R$ 900, dinheiro que eles não dispunham naquele momento, em que o saldo bancário estava no vermelho e não havia trabalho em vista. Eduarda sabia que aquela raça trazia sorte, e a lenda foi comprovada. “Enquanto ele preenchia o cheque desesperado, o telefone tocou e fechamos um contrato com o ator e produtor Paulo Betti.”

Sua paixão a fez montar uma comunidade virtual no Orkut, chamada “Meus Bichos São Meus Filhos.” A foto do seu perfil na rede é ao lado da gatinha, que também foi modelo de um dos seus CDs. O cão Sidarta, que tem um ornitorrinco de pelúcia, conheceu uma “namorada” pela rede, se casou e hoje tem filhos. Ele, aliás, carrega o sobrenome do marido de Eduarda. Já a gata carrega o sobrenome da “mãe”.

Os bichos dividem a cama com o casal. Quando viajam, procuram um hotel que aceite a família toda, principalmente um lugar onde possam ter contato com a natureza. “São meus filhos, mas não quero transformá-los em gente. Gosto deles porque são bichos. Não sou partidária de ‘peruagem’. Quando as pessoas querem transformar o bicho em gente, eles perdem a essência”, enfatiza, lembrando que uma vez viu uma mulher que levava seu cãozinho em um carrinho de bebê para que ele não sujasse as patas.

Quando está em algum trabalho externo, Eduarda fica com vontade de voltar para casa só para ficar com seus bichos. “Todos deveriam ter um. Eles ensinam a ser tolerante e a ter delicadeza até para entender o que querem”, destaca. “Sem eles, a vida não teria graça.”

Bichos milionários

Os bichos de estimação da milionária norte-americana Gail Posner, que era filha do empresário Victor Posner, herdaram R$ 21 milhões após sua morte. Para o filho, ela deixou R$ 1,7 milhão de herança. Gail faleceu em maio, aos 67 anos. Seus cachorros herdaram uma mansão avaliada em US$ 8,3 milhões, mas a sua predileta, uma chihuahua batizada de Conchita, ainda teve direito a colares de pérolas, um closet repleto de roupas e visitas a spas a bordo de um Cadillac. Outra fatia da herança foi destinada aos funcionários da mansão em Miami, que será garantida enquanto cuidarem dos animais. Sentindo-se lesado, seu único filho, Bret Carr, entrou com processo na Justiça pedindo revogação do testamento.

Há quem diga que a apresentadora norte-americana Oprah Winfrey tenha destinado cerca de US$ 60 milhões para seus cães. Mas se é para falar de cães milionários, vale lembrar da maltês Trouble, “filha” da milionária nova-iorquina Leona Helmsley, que era dona de uma cadeia de hotéis. Trouble vivia em uma cobertura no hotel Park Lane, no Central Park, Nova York. Um pianista do hotel compôs uma canção em sua homenagem. Já o chef era responsável pelo preparo das suas refeições, que eram servidas por uma governanta. Quando a milionária da hotelaria morreu, em 2007, garantiu à cadela uma fortuna de US$ 12 milhões, descrita em seu testamento de 14 páginas. Para o motorista ela deixou US$ 100 mil e para os netos, nada!, “por motivos que lhes são conhecidos.”

Mas este não foi o primeiro nem será o último caso de herança para animais. Na ocasião, o juiz abaixou o valor da herança para US$ 2 milhões e direcionou o restante para caridade. Aliás, gostar de bichos deve ser a única coisa que a mais alta classe tem em comum com mendigos e pessoas que vivem nas ruas. Eles não vivem sem o seu. (C.V./AE)

Psicoterapeuta alerta sobre os limites da relação

O professor e supervisor da Clínica de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP), Ari Rehfeld, alerta para os limites da relação com os bichos de estimação. Segundo ele, quando o animal é o companheiro de alguém que está sozinho, tudo bem, pois realmente preenche essa carência. Mas o sinal vermelho aparece quando o bicho substitui o desejo, a vontade e a necessidade de a pessoa se relacionar com humanos. “O limite é ultrapassado caso a pessoa prefira o bicho, em detrimento do ser humano.” Ari observa que o animal não é como uma pessoa, que discorda, discute, tem opiniões diferentes, outros gostos. “Esse tipo de diferença gera certa flexibilidade e você se desenvolve.” Para ele, o animal pode virar um cabide de projeção. “A pessoa projeta características humanas para o bicho.”

Fonte: Yahoo